sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Conto Vinte e Um. Que Estrada é Essa, Gente?







Essa Mulher é Uma Auto-Estrada
Suas curvas perigosas se tornavam mais insinuantes a noite. Não havia sinalização que pudesse prever os perigos e surpresas daquele corpo.  Era necessária uma boa visão periférica. Certa experiência de estrada.  Uma ousadia de corredor. Um caráter que não visse obstáculos e nevoeiros. Ela tinha a exata noção de seus dotes, e seus buracos eram bem camuflados, qualquer um que transitasse por essa estrada, a veria como uma capa retilínea e uniforme. Macia e confortável. É certo que havia um histórico de acidentes, mas nenhum fatal. Apenas ferimentos leves nos corações desavisados. Como poderíamos dizer? Ela gostava de motoristas intrépidos, mas prudentes. Difícil entender essa contradição. Mas abominava manobras bruscas, a desentendidos e abusos. Houve um sujeito em dada ocasião, que por tanta paixão, sobrou em uma curva. Foi uma tremenda capotada, a lataria do peito sofreu um tremendo baque. Foi um desgaste irremediável.
Talvez essa beldade fosse assim, desse jeito, porque morasse perto daquela estrada de terra batida, acanhada e esquecida. Em uma pequena cidade do interior. Era um lugar bucólico, mas monótono como um pronunciamento presidencial. Por outro lado, ela era meiga como uma marcha lenta. Um dia de sol com ela, então, o sortudo poderia vislumbra a estrada que levava para o céu. O clímax em alta velocidade se fosse o caso. Um dia o irmão dela estava deitado em um descanso coruscante. Estava em uma rede colorida no alpendre da casa e rindo, fazia piada com os seus encantos, dizia que ela precisava de uma recapada, de um projeto de reengenharia, que as estrias apareciam na iluminação dos faróis, só para sentir a sua reação. Logo ela retrucou, disse que suas aduncas eram novinhas, que com ela não existia pedágios, que ele sabia que seus pais, aqueles que a fizeram eram construtores de primeira, que suas medidas e o fluxo eram de transito livre.
Ninguém esperava por essa. Num dia de janeiro, numa sexta feira, uma manobra de bastidores foi criada por alguém da Paraíba, um homem mais assanhado, para interditar aquela belíssima auto-estrada, ao acesso alheio. Aos pais um pedido foi expedido, que anunciava a pretensão de contrair núpcias com aquela obra prima. Tudo parecia que teria esse desfecho. Todavia, uma semana depois ela apareceu escorregadia e sinuosa. Ao perguntarem sobre o “Cabra da Peste”, ela foi tomada de uma raiva ferrosa, um ressentimento angular. Para ela o tal sujeito, se mostrou um motoqueiro irresponsável, que gostava de se atirar na soberba. Por essa postura, a beldade fechou-se em neblinas. Nunca mais queria vê-lo. E realmente esse sujeito insensato nunca mais foi visto por aquelas bandas. Ela continuou linda a desafiar a pericia de outros corredores. Afinal, em suas belas curvas não é qualquer um que sabe guiar não.