sábado, 30 de outubro de 2010

Conto Quatorze. A Duvida Que Toda Mulher Têm.









É Noite de Peixada


Dona Salsinha era uma mulher prendada. Cozinhava como ninguém. Mas com o passar dos anos foi relaxando. Começou a tomar de vez em quando uns copos de cerveja. Logo estava viciada em levedura. Cara inchada. Com jeito de dobradinha. Os únicos elogios que recebia eram do padeiro Lagostim. Dizem as más línguas que ele era doido por uma mulher desregrada, mais gorda, encardida. Dizem que era uma tara. Então dona Salsinha cabia no perfil. De avental e tudo. Ela surpresa pensou bem no caso. Seria verdade? Ele não era propriamente bonito, mas tinha os seus encantos. Bastava tomar um bom banho, se barbear. E ela? Como será que estava? Sentia-se bem pelo menos? Como ela poderia se sentir bem? Os seus cabelos pareciam buchas de lavar louça, gosmentos e coisa e tal. O seu vestido tinha manchas escuras que lembravam gordura e restos de alimentos, e seus olhos eram duas formas escuras que pareciam bifes mal passados. O que pensava? Que se algum homem a visse agora, sairia correndo pela rua gritando: “corram todos, a cozinha de dona Salsinha acaba de ganhar vida, e vai nos atacar!” Ou pior, que ela era uma baranga, da pior espécie. Desanimada, constatou que ainda cheirava a cebola e a peixe. E assustada pensou: “será que estou com cara de filé de pescado?”. Não teve jeito. Naquela noite em um gesto de desespero ela jogou fora o dentão.

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